O Regresso do Exterminador Administrativo
terça-feira, 3 de maio de 2016
segunda-feira, 1 de junho de 2015
Regulamentos Administrativos
O Regulamento Administrativo
caracteriza-se por ser um acto positivo, imaterial e unilateral de órgão da
Administração Pública, que se encontra regido pelas normas de Direito Público,
visando produzir efeitos jurídicos através de um acto normativo de
características gerais e abstractas. Não se encontrando sob o conceito material
de Lei por não estar abrangido pelo regime de tipicidade dos actos legislativos
previsto no Nº1 do Artigo 112º da Constituição da República Portuguesa.
Os regulamentos administrativos
estão vinculados ao princípio da legalidade, como consequência da preferência
de lei, são proibidos os regulamentos delegados, conforme o Nº 5 do Artigo 112º
da Constituição da República Portuguesa, o que resulta na invalidade do
regulamento. No entanto é permitida a degradação hierárquica de uma matéria
constante em forma de lei para a forma de regulamento, salvaguardando a
existência de norma habilitante para o efeito e não se tratar de matérias
sujeitas a reserva legislativa, sendo esse processo denominado de
deslegalização.
Como consequência da preferência
de lei há que referir que a criação de uma lei posterior legislando sobre a
mesma matéria revoga o regulamento, assim como, excepto se o contrário
especificado, a revogação da lei habilitante resulta na revogação por
caducidade do regulamento.
A aplicação judicial de
regulamentos ilegais não é possível por força do disposto no Artigo 204ª da
Constituição da República Portuguesa, sendo passiveis de impugnação contenciosa
ou de ilegalidade com base no Nº2 do Artigo 73ª e nos Artigos 72º e 76º do
Código de Processo dos Tribunais Administrativos e do Nº 5 do Artigo 268ª da
Constituição da República Portuguesa.
Para a elaboração de um
regulamento é necessária a lei habilitante, sendo varável o grau de densidade
normativa, sendo que são proibidos regulamentos retroactivos. Para a existência
de retroactividade seria necessária uma habilitação específica.
Conforme previsto no Artigo
241º da Constituição da República Portuguesa, os regulamentos encontram-se
hierarquizados, sendo essa hierarquia estabelecida por 3 critérios:
Órgão emissor: prevalece o órgão de posição hierárquica
superior, pela
ordem de Governo, órgãos supraordenados e órgãos infraordenados;
Âmbito geográfico: prevalece a Pessoa Colectiva com maior
abrangência
geográfica;
Forma: prevalece o regulamento com a forma mais solene.
Apesar do estabelecimento de
método de hierarquização dos regulamentos, o regime não é absoluto, sendo de
considerar a conjugação dos critérios de maior relevância e diferenciar que
critério melhor se aplica para a questão a analisar.
Apesar da sua função
inovatória, que resulta numa dinamização global da ordem jurídica, os
regulamentos administrativos são ferramentas de execução e complementariedade
das leis. Isto advem do facto de o órgão legislador habilitar a entidade reguladora
a executar a lei inicial e complementar eventuais lacunas e aspectos de
pormenor de execução que não se enquadrariam na letra da lei a regular, dando
maior latitude de acção para o órgão regulador definir com maior exactidão os
apectos de pormenor.
É possível diferenciar os
regulamentos administrativos relativamente ao âmbito da sua eficácia, o que
leva a diferenciar entre regulamentos internos e externos. Os regulamentos
internos, referem-se à organização e funcionamento da Pessoa Colectiva a que
pertence o órgão que os emana, carecendo de eficácia externa, logo não sendo
abrangido pelo regime estatuído pelos Artigos 115º a 118º do Código de
Procedimento Administrativo, levando a que o seu modo de produção carece de
formalismo previsto. Relativamente aos regulamentos administrativos com
eficácia externa, que produzem efeitos jurídicos fora da Pessoa Colectiva do
órgão que os emana, são classificados como externos e o seu regime está
previsto nos Artigos 115º a 118º do Código de Procedimento Administrativo.
Dos regulamentos com eficácia
externa, ou regulamentos externos, carece considerar quanto ao procedimento administrativo
regulamentar, relativo à elaboração e aprovação do regulamento.
O procedimento de abertura do
processo regulamentar pode ter o seu início em iniciativa privada, através de
petição, conforme o Artigo 115º do Código de Procedimento Administrativo, ou
iniciativa pública, conforme o Artigo 54º do mesmo Código.
A fase de preparação do
projecto de regulamento é uma fase desformalizada que se assemelha à fase de
instrução do acto administrativo, onde estão previstas as diligências
administrativas, nos Artigos 86º a 97º do Código do Procedimento
Administrativo, e a nota justificativa fundamentada, prevista no Artigo 116º do
mesmo Código.
A participação dos interessados
é feita em audiência e apreciação pública, conforme previsto no Artigo 117º do
Código do Procedimento Administrativo, mediante a expressão de opinião por
qualquer interessado, conforme o Artigo 103º do mesmo Código. De salientar que
a modificação essencial do carácter do regulamento conduz a uma nova audiência
ou apreciação pública, dependendo da forma inicial.
O processo é concluído com a
aprovação do regulamento, através de decisão ou deliberação, ou da não
aprovação do regulamento resulta no arquivamento da petição.
Em termos de requisitos de
legalidade dos regulamentos, podem ser divididos em requisitos objectivos e
subjectivos. Os requisitos subjectivos resumem-se à determinação da competência
e idoneidade do autor, enquanto na componente objectiva são apreciados
requisitos de natureza material, formal e funcional.
Em termos de requisitos
objectivos materiais é necessário ter em consideração o conteúdo e pressupostos
de facto e de direito, considerando em termos de possibilidade e
inteligibilidade, garantindo que não se trata de matéria de reserva de lei nem
contrariara o bloco de legalidade.
Em termos de requisitos
objectivos formais é necessário ter em conta a forma exigida pela Constituição
da República Portuguesa e pela lei, o cumprimento das formalidades prévias de audiência
de interessados, consulta pública e nota justificativa, havendo necessidade de
indicação da lei regulamentar ou da lei definidora da competência para a sua
emissão, sendo proibidas as revogações tácitas, visto que os regulamentos têm
de indicar expressamente as normas que revogam, conforme o Nº2 do Artigo 119º
do Código do Procedimento Administrativo, assim como o cumprimento do prazo,
conforme estabelecido analogamente pelo Artigo 58º do CPA, sendo que o seu
incumprimento implica inconstitucionalidade formal, prevista pelo Nº7 do Artigo
112º da Constituição da República Portuguesa.
Em termos de requisitos
objectivos funcionais é necessário ter em consideração o interesse público
definido por lei, assim como o respeito pelo princípio da proporcionalidade na ponderação
de todos os interesses públicos relevantes.
Relativamente aos vícios de
desvalores aplicados aos regulamentos administrativos é necessário ter em
consideração que os regulamentos ilegais têm como desvalor a sua invalidade.
Da inconstitucionalidade do
regulamento resulta na sua nulidade, assim como da violação da lei resulta do
Nº5 do Artigo 112º da Constituição da República Portuguesa, igualmente na
nulidade do regulamento.
Da violação de parâmetros
infralegais da actividade administrativa, apenas é admitida a nulidade conforme
expresso no Nº1 do Artigo 137º do Código do Procedimento Administrativo.
Da preterição de uma
formalidade de carácter meramente interno, a nulidade seria um efeito
claramente desproporcional, para uma situação de mera irregularidade, o que
resulta de haja produção dos efeitos jurídicos pretendidos mas podendo haver
consequências disciplinares.
A produção de efeitos jurídicos
só ocorre depois do conhecimento pelos destinatários, recorrendo-se à
publicação em Diário de República ou a publicidade. Como requisito negativo de
eficácia, existe a ausência de suspensão, quer seja pela eficácia suspensiva
administrativa, conforme Nº1 do Artigo 119º do Código do Procedimento
Administrativo, quer seja pela eficácia suspensiva jurisdicional, conforme
Artigo 130º do mesmo Código.
Relativamente aos regulamentos
internos, o requisito mínimo de eficácia é a garantia de possibilidade de
conhecimento pelos destinatários.
A cessação da vigência dos
regulamentos dá-se por uma de três formas: por revogação, derivada de
superveniência de uma lei ou regulamento de nível hierárquico superior; por
caducidade, via superveniência de um facto ou por declaração de ilegalidade com
força obrigatória geral, jurisdicional ou administrativa, conforme os Artigo
72º e 76º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos.
Elaborado por: Pedro Vieira, n.º 24730
Breve análise da evolução comparativa dos sistemas administrativos Anglo-Saxónico e Romano-Germânico
Antes da análise dos sistemas
em específico, vamos iniciar com uma breve distinção histórica dos tipos de
Estado, focando na sua evolução europeia em particular, dividindo em 4 grandes
grupos:
-
Estado Pré-Constitucional: após
a queda do Império Romano, a Europa foi dominada pelo Feudalismo da Idade
Média, no qual a Administração Pública era residual e incipiente, reduzida à
capacidade de cobrança de impostos e manutenção da capacidade bélica do Estado.
As necessidades colectivas eram essencialmente mantidas pela estrutura
religiosa cristã (residual da organização do Império Romano).
A evolução do Feudalismo foi no
sentido do Absolutismo e do Estado de Polícia, caracterizados por uma contínua
e crescente concentração de poderes na figura do monarca.
-
Estado Liberal: o
crescente descontentamento das populações face à indiferença social que
caracterizou o Absolutismo levou a grandes convulsões sociais que redundaram nas
Revoluções Liberais e no triunfo do Liberalismo, do qual podemos enunciar as
duas principais correntes: a do princípio da separação dos poderes em sentido
rígido, conforme enunciada por Montesquieu; e da soberania popular defendida
por Rosseau. Em ambas o Direito surge como limite dos poderes públicos, sendo o
princípio da legalidade o limite e o fundamento da actividade administrativa.
-
Estado Social:
decorrente da Primeira Guerra Mundial é possível contar como uma das baixas o
conceito da sociedade auto-regulada criado pelo optimismo liberal. Surge um
novo conceito de Administração Pública, com novas tarefas e áreas de acção,
passando de uma Administração agressiva para uma Administração de cariz essencialmente
prestacional. A rigidez do princípio da separação de poderes passa a ser
encarada como um conceito flexível, com evolução histórico-temporal. É adoptado
um novo conceito de legalidade, no qual todos os elementos normativos limitam a
actividade administrativa, passando para a esfera da função jurisdicional o
controlo jurídico da actividade administrativa pública.
No Estado Social de Direito é
possível individualizar o conceito de Estado-Providência que tem como objectivo
ir para além da garantia dos patamares mínimos de bem-estar através de uma
intervenção directa do Estado.
Em consequência das diferentes
crises que flagelaram o início do século XXI, e consequente diminuição da
capacidade de intervenção dos Estados levando ao Estado Social Pós-Providência
que se caracteriza essencialmente pelo seu cariz de administração
infra-estrutural.
-
Estados de Não-Direito:
em consequência da crise do Estado Liberal, e contemporaneamente ao Estado
Social, surgem novas ideologias, que apesar de diametralmente opostas no
espectro político, mostram partilhar de traços de anti-liberalismo,
anti-democracia e totalitarismo. Dos quais podemos referir o Estado Socialista
(caracterizado pela apropriação colectiva dos meios de produção e pelo
desaparecimento de considerável parte das liberdades individuais, levando a um
expoente máximo da Administração Pública em que o Estado é produtor e
consumidor) e o Estado Fascista (caracterizado por ser um regime político
dictorial em que as liberdades individuais são postas em causa por uma
Administração Pública com uma esfera de acção muito mais ampla em termos de
agressividade e prestação).
Da
evolução histórica do conceito de Direito Administrativo
Com a Revolução Francesa, e
instauração do modelo de Estado Liberal, podemos afirmar que existe o
surgimento do Direito Administrativo Moderno. No âmbito da consagração do
princípio da separação de poderes, os tribunais comuns são excluídos do
julgamento da Administração Pública, surgindo assim uma situação de
contrassenso em que a Administração julgava a própria Administração.
Esta situação do sistema
francês não ocorria no sistema britânico, pois a acção da Administração estava
sujeita ao Commom Law.
Com Bonaparte ocorreram
alterações de forma a terminar com o administrador juiz, no entanto,
mantinha-se a situação de promiscuidade de Administração a julgar
Administração, uma vez que os pareceres do Conselho de Estado necessitavam de
homologação pela Governo. Apesar da evolução posterior para a dispensa da
necessidade e homologação dos pareceres do Conselho de Estado, o mesmo mantém a
situação de um órgão administrativo a julgar a Administração.
A situação de promiscuidade
entre a Administração e a Justiça manteve-se em França até aos finais do século
XIX, início do século XX, até ao acórdão de Agnes Branco, momento considerado
como a base jurisprudencial da autonomização do Direito Administrativo.
No Reino Unido o sistema
liberal é implementado de forma diferente, estabelecendo um regime em que é
dispensada a ideia de superioridade dos poderes, colocando sobre a alçada dos
tribunais o contencioso administrativo, resultando num sistema de administração
judiciária, no qual a Administração Pública actua de acordo com a Commom Law.
A evolução e surgimento para o
Estado Social altera o paradigma do conceito de Estado, com o seu enfoque no
âmbito económico e social, tornando a função administrativa na função
primordial do Estado, o que se reflecte num aumento da Administração Pública e
uma alteração de uma posição agressiva para uma posição de prestação de
serviços, de intervenção na vida dos cidadãos com vista à satisfação das
necessidades colectivas.
Essas alterações levaram à
multiplicidade da actuação da Administração, para além do acto administrativo e
alterando-o para uma posição de submissão legal e de respeito dos interesses
dos particulares, com uma redução do seu factor coactivo.
No direito francês a divisão do
Conselho de Estado, no final do século XIX, numa secção administrativa e outra
jurisdicional, veio dar uma crescente autonomia à secção contenciosa que foi
reconhecida como verdadeiro tribunal na década de 80.
A evolução do modelo
administrativo anglo-saxónico foi inversa, com a criação de órgãos com poderes
de autotutela no âmbito do Direito Administrativo, autoridades independentes
com poder de decisão sem sujeição a controlo jurisdicional, o que cria uma
aproximação dos sistemas por via de movimentos de sentidos contrários.
Com os efeitos das crises da
década de 60, e consequente surgimento do Estado Pós-Social, o Estado assume
funções de regulação em detrimento da prestação de serviços, o que resulta numa
crescente preocupação para a criação de condições para a prestação de serviços
por outras entidades, o que acrescenta um factor de multilateralidade nas
relações jurídicas administrativas.
A evolução do Direito
Administrativo levou a uma constitucionalização da justiça administrativa,
levando à integração dos tribunais administrativo na esfera judicial e à
consagração constitucional de direitos dos particulares que prevalecem face à
Administração. Com o processo de integração europeia, ocorre um fenómeno
supranacional de institucionalização de Direito Administrativo Europeu, em sede
do Direito da União Europeia, o que leva a prever à formação de Direito
Administrativo Global (ou tendencialmente global).
Do Direito Administrativo
Europeu, podemos ver a tendência de criação de um sistema híbrido em que são
conjugados os princípios vigentes e comuns do sistema anglo-saxónico (sistema
de administração judiciária) e do sistema romano-germânico (sistema de
administração executiva), havendo uma conjugação dos princípios da legalidade e
produção legislativa com as tendências de forte vinculação jurisprudencial, que
fazem prever um movimento de comunhão, expectativamente, do melhor dos dois
sistemas.
Elaborado por: Pedro Vieiria, n.º 24730
Acto Administrativo
Acto
Administrativo –
é um acto jurídico voluntário, unilateral, podendo ser bilateral, que visa a
produção de efeitos jurídicos, correspondendo ao exercício da função
administrativa e de uma competência legal.
Os actos administrativos não
representam a função técnica, as operações materiais, nem a práctica de actos
meramente involuntários.
A unilateralidade dos actos
administrativos implica que os mesmos não se dependem da concordância de
terceiros para garantir a sua validade e perfeição. A necessidade de audiência
prévia ou consulta pública não afecta a unilateralidade dos actos em virtude da
ausência de vinculação da pronúncia para a decisão final.
A ausência de produção de
efeitos jurídicos não releva para a validade do acto, como é exemplo um acto
que necessite da aceitação de terceiro para ser eficaz, ou actos sujeitos a
condições suspensivas. No entanto, a classificação de um acto jurídico como
acto administrativo necessita da verificação dos requisitos de validade.
Apesar do previsto no Artigo
148º do Código do Procedimento Administrativo, de que os actos administrativos
visam a produção de efeitos jurídicos externos, existem actos administrativos
de efeitos meramente interno, o que não o invalida nem inibe a produção de
efeitos.
O exercício da função
administrativa não obriga a que os actos administrativos sejam praticados por
órgãos pertencentes à Administração Pública, visto existirem entidades que não
pertencem no sentido orgânico mas que exercem funções administrativas, e,
consequentemente, praticam actos administrativos.
Apesar do carácter decisório
dos actos administrativos, é necessário debater a questão dos pareceres de
carácter vinculativo, se os mesmos tiverem um carácter obrigatório definido por
lei, vão definir o sentido da decisão, logo vão ter um teor decisório e não
meramente opinativo.
Apesar do carácter individual e
concreto do acto administrativo, no que se refere aos seus destinatários e à
situação em que se aplica, o mesmo não se aplica para os regulamentos
administrativos, visto terem carácter geral e abstracto.
Esquema
de Classificação dos Actos Administrativos
Relativamente ao Autor:
Decisões: praticados por órgãos singulares;
Deliberações: praticados por órgãos
colegiais;
Simples: produzidos por um único órgão;
Complexos: quando são produzidos por 2
ou mais órgãos.
Relativamente aos
Destinatários:
Singulares: com um único destinatário;
Plurais: com 2 ou mais destinatários;
Colectivos: para um conjunto unificado de
destinatários;
Gerais: para todos os destinatários de
um grupo inorgânico;
Bipolares: assentam numa relação
bilateral entre o órgão emissor do acto e o seu destinatário e produzem efeitos
apenas em relação ao destinatário;
Multipolares: assentam em relações jurídicas
multilaterais e afetam os respetivos destinatários e terceiros.
Relativamente ao Objecto:
Primários: incidem pela primeira vez
sobre uma situação;
Secundários:
incidem sobre
um ato administrativo anterior.
Relativamente ao Conteúdo:
Positivos: introduzem os efeitos
jurídicos pretendidos ou solicitados;
Negativos: não introduzem os efeitos
jurídicos pretendidos ou solicitados.
Declarativos: comprovam situações jurídicas
existentes;
Constitutivos: criam, modificam ou extinguem
situações jurídicas existentes.
Verificativos: reconhecem factos ou a
existência de situações jurídicas;
Determinativos: impõem uma acção, omissão ou que
se suporte algo e/ou aplicam, ou a uma coisa, uma determinada classificação;
Permissivos: facultam o exercício de uma
atividade que de outro modo não seria consentida ou possibilitam a omissão de
uma conduta que de outro modo seria imposta;
Atributivos: conferem um estatuto ou o
direito a uma prestação administrativa que não se esgota na sua própria emissão.
Relativamente à Colaboração:
Independentes: emitidos sem necessidade de
solicitação por um particular e não estão dependentes da aceitação deste como
condição da sua eficácia;
Carecidos: subdividem-se em duas categorias:
Dependentes
de iniciativa particular:
só podem ser emitidos após ser solicitada a acção por um particular legitimado;
Sujeitos
a aceitação dos destinatários:
dependem da aceitação dos destinatários para produzirem efeitos jurídicos.
Relativamente aos Efeitos:
Internos: produzem efeitos exclusivamente
na esfera da pessoa do seu autor;
Externos: produzem efeitos para além da
esfera da pessoa do autor.
Favoráveis: com efeitos vantajosos para as
pessoas cujas esferas são
afetadas;
Desfavoráveis: com efeitos desvantajosos para
as pessoas cujas esferas são afetadas.
Exequíveis: carecem de uma atividade complementar
de execução;
Inexequíveis: dispensam qualquer execução
subsequente.
Lesivos: afectam as posições jurídicas
dos visados;
Não
lesivos: são
integralmente favoráveis para todos os visados.
Relativamente à Função:
Preparatórios: antecedem uma resolução final
e servem para a criação das condições para o seu cumprimento;
Decisórios: substanciam a resolução final e
terminam o procedimento;
Execução: põe em prática o conteúdo dos
actos decisórios;
Dispositivos: resultam do exercício da
competência dispositiva;
Revisivos: os que resultam do exercício
de uma competência revisiva, incidem sobre uma prévia conduta administrativa;
Pressupostos: dos quais depende a
prática posterior de outros actos;
Consequentes: praticados em virtude de
actos anteriores.
Em resumo:
Actos Administrativos
Autor Decisões
Deliberações
Simples
Complexos
Destinatário Singulares
Plurais
Colectivos
Gerais
Bipolares
Multipolares
Objecto Primários
Secundários
Conteúdo Positivos
Negativos
Declarativos
Constitutivos
Verificativos
Determinativos
Permissivos
Atributivos
Colaboração Independentes
Carecidos Iniciativa Particular
Aceitação Destinatário
Efeitos Internos
Externos
Favoráveis
Desfavoráveis
Exequíveis
Inexequíveis
Lesivos
Não
Lesivos
Função Preparatórios
Decisórios
Execução
Dispositivos
Revisivos
Pressupostos
Consequentes
Elaborado por: Pedro Vieira, n.º 24730
domingo, 31 de maio de 2015
Acórdão - Simulação de Julgamento
Tribunal Administrativo do Círculo de
Lisboa
Processo: 001/2015
Ação
administrativa especial de impugnação de Regulamento e Ato Administrativos
Coletivo de Juízes:
- João Couto
- Luís Godinho
- Luís João
- Nélson Chicomba
- Paulino Morais
- Pedro Vieira
- Rafael Lima
- Sónia Fernandes
Autores:
- Feliciano Yanaqué, casado,
residente na cidade de Piura, no Perú
- Associação dos Hotéis
Históricos de Lisboa, Associação
- Associação dos Restaurantes
e Tascas Finas de Lisboa, Associação
Réu:
- Câmara Municipal de
Lisboa, com sede nos Paços do Concelho, Praça do Município, 1149-014 Lisboa.
Os
Autores, em síntese, ao abrigo do disposto do Nº 2 do Artigo 46º e do Nº1 do
artigo 51º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (doravante CPTA)
intentam contra o Réu. Os Autores consideram que têm legitimidade para intentar
a ação em apreço, ao abrigo dos Nº 1 e 2 do Artigo 58º do CPTA. Intervirão
neste processo, como partes interessadas, as Associações dos Hotéis Históricos
de Lisboa e dos Restaurantes e Tascas Finas de Lisboa, ao abrigo do Nº 2 do
Artigo 9º e do Artigo 55º do CPTA. Alegam os Autores:
1 Cobrança indevida de uma taxa de um
euro no aeroporto de Lisboa. Aquando do primeiro ato de cobrança da taxa de
entrada no município de Lisboa no montante de um euro, Feliciano Yanaqué pisou
o chão do aeroporto de Lisboa, mas não obteve contrapartida com o pagamento da
mesma, não usufruindo de um serviço prestado pois não passou mais do que uns
minutos no município de Lisboa, partindo logo para Fátima. Sendo que o
Aeroporto Internacional de Lisboa não passa de um mero local de entrada/saída,
não pode haver uma imposição coercitiva a título de Taxa Municipal Turística,
fixada por um dos Municípios onde, espacialmente, se situa o Aeroporto.
2 Cobrança indevida de uma taxa de cinco
euros por 5 dias de estadia na cidade de Lisboa. Quanto ao segundo ato, a
cobrança de uma taxa de alojamento de cinco euros, apesar de Feliciano Yanaqué
ter ficado hospedado por 5 dias num hotel na cidade de Lisboa, não lhe parece
ser aceitável conforme os argumentos apresentados no ponto 1.
3 Violação do princípio da
proporcionalidade nos termos do Artigo 18º da Constituição da República Portuguesa
(doravante CRP) pela taxa não se mostrar necessária nem sequer adequada ao fim
a que se destina. Não havendo adequação da aplicação da taxa de entrada ao fim
que a mesma pretende atingir, é nula por violação do princípio da
proporcionalidade de acordo com o Nº1 do Artigo 143º e pelo Nº1 do Artigo 144.º
do CPA. Com base no Nº 2 do Artigo 266º da CRP estamos perante uma violação dos
princípios da proporcionalidade e da justiça, por haver uma afetação excessiva
da atividade turística, não sendo razoável a criação de uma taxa sobre uma
contrapartida já refletida no preço cobrado pela sua estadia. Afigura-se como
ilegítima e desproporcional a imposição de uma taxa de entrada na cidade de
Lisboa, na medida em que não haja intenção de permanecer no município de
Lisboa, o que desqualifica os fundamentos implícitos à criação da taxa de
contribuição na preservação, manutenção e desenvolvimento da cidade e pelo
usufruto das ofertas e espaços públicos.
4 Violação do princípio da igualdade nos
termos do Artigo 13º CRP e do Artigo 6º do CPA no sentido de haver uma discriminação
na aplicação destes tributos. A Câmara Municipal de Lisboa liquidou e cobrou
uma imposição monetária, que, assente em razões de equidade, deveria ser
distribuída por todos os Municípios onde o cidadão não nacional se deslocasse e
permanecesse. A taxa imposta pelo município de Lisboa viola o princípio da
igualdade imposto no Artigo 13º da CRP ao criar uma descriminação entre os
utentes que entram na capital apenas de passagem e aqueles que entram para
ficar. Tais situações não podem ser dadas como equivalentes. No caso do Autor, ele
apenas ia fretar uma viatura para ir direito a Fátima, não pensando sequer
chegar efetivamente a entrar na capital, como erradamente se presumiu.
5 Ausência de notificação, o que viola o
disposto na alínea c) do Nº 2 do Artigo 114º do CPA. Esta seria essencial
porque os atos em causa afetam direitos e interesses legalmente protegidos bem
como as condições para o seu exercício e porque seria o ponto em que o Autor poderia
reclamar a validade dos atos em questão. Em ambos os tributos houve
deficiências na sua notificação, não respeitando o previsto na alínea c) do Nº
2 do Artigo 114º do CPA. O pagamento deve ter o valor de aceitação do ato para
efeitos do Artigo 56º do CPTA, sendo necessário assegurar o acesso à tutela
jurisdicional nos termos do Nº 4 do Artigo 268º da CRP e do Artigo 2º do CPTA.
6 Incompetência para o estabelecimento
da taxa, por via da imposição do princípio da legalidade (Artigo 226, Nº 2 da
CRP, Artigo 3º do CPA e Artigo 45º da Lei das Autarquias Locais – doravante LAL)
e em virtude da reserva relativa da Assembleia da República para a criação de
impostos, conforme o disposto na alínea i) do Nº 1 do Artigo 165º da CRP. Sendo
matéria de reserva relativa da Assembleia da República, a mesma poderá criar
impostos ou autorizar o Governo à criação dos mesmos. Na ausência de
autorização legislativa a criação do tributo será inconstitucional e não
existirá obrigatoriedade do pagamento por força do Nº 3 do Artigo 103º da CRP.
No domínio do poder tributário das autarquias locais, a criação de taxas está
prevista no Artigo 238º e na alínea n) do Artigo 288º da CRP.
7 Ilegalidade do regulamento camarário
que cria a taxa, em virtude da vinculação total da administração ao princípio
da legalidade, pelo que tais impostos são desprovidos de sentido legal, por
força da alínea k) do Nº 2 do Artigo 161º do CPA. Na medida em que os impostos
criados pelo Governo no âmbito da competência legislativa da Assembleia da
República que padeçam de autorização da mesma são inconstitucionais, estamos
perante uma ilegalidade de competência bem como perante uma
inconstitucionalidade orgânica quanto à sua criação municipal. Aplicar-se-á,
deste modo, a alínea b) do Nº 2 do Artigo 59º da LAL, em conjugação com a línea
b) do Nº 2 do Artigo 161º do CPA, resultando na nulidade do ato.
Dispõe o
artigo 8.º, n.º 1 e n.º 2 da Lei n.º 53‐E/2006
que as taxas são criadas por
regulamento aprovado pelo órgão deliberativo respetivo, definindo-se,
mormente, a forma de liquidação da taxa e a fundamentação legal da isenção. O Regulamento
da taxa não contém as fundamentações enunciadas; nem, nos termos Nº 2 do Artigo
136º do CPA, indica expressamente as leis que definem a competência subjetiva e
objetiva para a sua emissão. Omissão que constitui causa de invalidade nos
termos do Nº1 do Artigo 143º e do Artigo 144, resultando de anulabilidade do
mesmo.
8 Valores cobrados são impostos e não
taxas porque o imposto é um ato unilateral na medida em que o Estado não confere
a quem paga uma contrapartida direta e imediata; não apresenta carácter de
sanção; tem fundamento legal e é definitivo, ou seja, o contribuinte não será
reembolsado pelo montante pago. No imposto, o serviço prestado não é suscetível
de atribuição individual aos cidadãos (contrariamente com o que acontece com a
taxa). No fundo, o imposto consiste numa contribuição imposta a todos ou a uma
certa categoria de pessoas de acordo com a sua capacidade contributiva e tem
como finalidade financiar o Estado e as funções públicas em geral. A taxa tem
que determinar proporcionalidade em relação ao benefício específico
proporcionado pelo serviço prestado ou pelo custo suportado pela comunidade com
a utilização do bem de domínio público. Não pode, nunca, ser fixado em função
da capacidade contributiva revelada pelo indivíduo que a paga. Nos impostos,
essa fixação já é possível, ou seja, são pagos em função da capacidade
contributiva revelada e não em função do valor do serviço prestado. Estamos
perante um imposto travestido de uma taxa, pois não se usufruiu de um serviço
concreto numa relação de bilateralidade apenas por utilizar o aeroporto, um bem
de domínio público e, por isso, mais suscetível de ser enquadrado como um
imposto, onde não existe a prestação de um serviço concreto mas, ao invés, a
utilização de um bem do domínio público, numa relação de unilateralidade. Porquanto
não se vislumbra da existência de uma relação sinalagmática que se estabelece
por via do benefício individualizado auferido por cada turista, nomeadamente
pelos serviços de informação e apoio aos turistas, tal taxa é violadora do Nº 2
do Artigo 4º nº 2 da Lei Geral Tributária (doravante LGT). A taxa é ilegal por
carecer de fundamento nos termos da alínea k) do Nº2 do Artigo 161º do CPA e do
Artigo 4º da LGT, ou tratando-se de um imposto camuflado, sendo portanto nula
por falta de competência do município para a sua criação, por força da alínea
b) do Nº 2 do Artigo 161º do CPA, e do Nº 1 do Artigo 25º da LAL e da alínea b)
do Nº 2 do Artigo 59º da LAL, uma vez que estes apenas podem ser criados pela
Assembleia da República conforme a alínea i) do Nº1 do Artigo 165º da CRP.
9 Da Ilegalidade da cobrança por violação
do Direito da União Europeia, nomeadamente do Direito de Livre Circulação no
território dos Estados-Membros. Não sendo que esta taxa tenha como justificação
razões de ordem, segurança ou saúde pública sendo ilegal a fixação das mesmas a
nível municipal. A legislação da União Europeia proíbe a discriminação em razão
da nacionalidade. Tal aplica-se às discriminações ostensivas em razão da
nacionalidade e, salvo justificação em contrário, às formas dissimuladas. Nos
termos do Nº1 do Artigo 144º do CPA são inválidos os regulamentos que sejam
desconformes com direito da União Europeia, nomeadamente os Artigo 18º e
seguintes do Tratado de Funcionamento da União Europeia (doravante TFUE).
Notificados
os Réus, os mesmos respondem, invocando:
1 As taxas visam facilitar ou
dificultar, desfavorecendo o uso imoderado, o acesso aos serviços públicos e
proceder à justa distribuição dos encargos públicos. Tendo uma finalidade
compensatória, pois visam a compensação da prestação, são cobradas em três
situações:
Pela
utilização de bens de domínio público;
Pela
obtenção de um serviço público;
Pela
remoção de um obstáculo jurídico ao exercício da atividade privada.
Neste
caso em particular, foi utilizado um bem de domínio público, pelo facto de os
dois turistas terem estado alojados num hotel e por terem visitado a cidade,
utilizando obrigatoriamente as suas infraestruturas.
2 A criação das taxas visa a
qualificação urbanística, territorial e ambiental, como refere o Nº1 do Artigo
5º da Lei 53-E/2006 de 29 de dezembro, sendo a fixação do valor das taxas da
competência da Câmara Municipal, conforme a alínea a) do Nº2 do Artigo 8º da
Lei 53-E/2006 de 29 de dezembro.
3 As taxas devem ser fixadas de acordo
com o princípio da proporcionalidade, como consta do Nº1 do Artigo 4º da LAL. O
princípio da proporcionalidade, previsto no Nº1 do Artigo 266º da CRP e no
artigo 7º, Nº1 do CPA, é salvaguardado com os benefícios recebidos em troca do
pagamento das taxas que irá contribuir para o melhoramento das infraestruturas
públicas da cidade.
4 A taxa municipal sobre o alojamento é
de um euro por noite e a taxa de entrada por via aérea, cobrada no aeroporto é
também de um euro, valores baixos comparados aos de outras cidades europeias,
que também aplicam taxas aos turistas, como contrapartida das infraestruturas
oferecidas pela cidade, só estando em aplicação a taxa de pernoita, pois a taxa
do aeroporto vai ser assumida na sequência de acordo celebrado com a autarquia
pela empresa Voa, Voa – Aeroporto de Lisboa.
5 As taxas foram criadas segundo o Nº 4
do Artigo 238º da CRP, sendo taxas administrativas de carácter sinalagmático,
por serem tributos bilaterais. Os turistas, ao fazerem o pagamento das
referidas taxas, beneficiam em troca das infraestruturas oferecidas pela
cidade. Segundo a alínea b) do Nº1 do Artigo 25º da LAL, compete à Assembleia
Municipal, sob proposta da Câmara Municipal, aprovar as taxas do município e
fixar o respetivo valor, conforme o Nº 1 do Artigo 8º do Regime Geral das Taxas
das Autarquias Locais. Segundo o Nº 1 do Artigo 36º do CPA, a competência é
definida por lei ou por regulamento, pelo que nos termos da alínea b) do Artigo
3º da LAL, o planeamento é uma atribuição das Autarquias Locais, sendo que, nos
termos da alínea c) do Nº1 do Artigo 33º, é da competência da Câmara Municipal
a elaboração do seu orçamento. Os municípios podem criar taxas, nos termos do
regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, no Nº2 do Artigo da Lei 53-E/2006
de 29 de dezembro.
6 A primeira taxa de um euro, pela
entrada em Lisboa, tem como objetivo promover o turismo investindo esse valor
na melhoria das infraestruturas, pontos de interesse cultural, histórico,
gastronómico. A segunda taxa de cinco euros tem como contraprestação as
infraestruturas oferecidas pela cidade e todos os custos que a Autarquia de
Lisboa acarreta implicitamente com a estadia de turistas.
7 Apesar da alínea i) do Nº1 do Artigo
165º da CRP dizer que é da competência relativa da Assembleia da República a
criação de impostos e regime geral das taxas, o Artigo Nº 241 da CRP vem dizer
que as autarquias locais dispõem de poder regulamentar próprio e ainda o Nº 4
do Artigo 238º diz que as autarquias locais podem dispor de poderes
tributários, nos casos e nos termos previstos na Lei.
8 Segundo a alínea b) do Nº1 do Artigo
25º da Lei n.º 75/2013, compete à Assembleia Municipal, sob proposta da Câmara
Municipal, aprovar as taxas do município e fixar o respetivo valor. O Nº1 do
Artigo 8º do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais estabelece que estas são
criadas por regulamento aprovado pelo órgão deliberativo respetivo.
9 Segundo o Artigo 3.º da Lei Nº 53-E/2006,
as taxas das autarquias locais tratam-se de tributos que assentam na
contraprestação, sinalagmática, pecuniária, associada a um serviço ou benefício
proporcionado por uma Entidade Pública mais que não seja a utilização das
estradas da autarquia e das infraestruturas do aeroporto como se verificou.
10 A liquidação e cobrança de uma taxa,
como ato administrativo que é, está sujeito ao princípio da igualdade e da
proporcionalidade. A igualdade de tratamento entre cidadãos nacionais e
estrangeiros (Artigo 13º da CRP) não é colocada em causa pela aplicação de uma
taxa por ser a mesma, por definição uma contraprestação, ou seja dela advirá um
benefício direto para o cidadão estrangeiro.
11 Em relação à cobrança a estrangeiros
alega-se o princípio da discriminação positiva.
12 O princípio da igualdade presente no Artigo
13º da CRP não foi violado, assim como as disposições do Artigo 15º da CRP
foram respeitadas. O ato administrativo em questão caracteriza-se por
impositivo e de plena obrigatoriedade para qualquer particular, sendo que
decorre do Nº 1 do Artigo 15º da CRP que cidadãos estrangeiros que se encontrem
em Portugal estão sujeitos aos deveres e obrigações em vigor. Em suma foi
respeitado o princípio da equiparação jurídica.
13 A alegação de violação do princípio da
proporcionalidade não se verifica real, na medida em que a taxa foi criada no
sentido de cobrir o investimento necessário à manutenção as infraestruturas e
sustento do setor turístico de Lisboa, sendo a taxa proporcional ao fluxo de
turistas que a cidade alberga.
14 O princípio da razoabilidade também não
foi violado, na medida em que os custos são inferiores às vantagens, ao abrigo
do Nº 2 do Artigo 266 da CRP.
Apreciando.
Atendendo
ao alegado pelas Partes, audição das testemunhas apresentadas e aos documentos
juntos aos autos, consideram-se assentes por relevantes à decisão a proferir os
seguintes factos:
1 A 11 de abril de 2015, Feliciano Yanaqué,
acompanhado de sua esposa, Gertrudis Yanaqué, aterrou no aeroporto da Portela,
em Lisboa, proveniente de Piura, Perú.
2 Aquando da sua chegada ao aeroporto,
foi cobrada pela empresa Voa Voa – Aeroporto de Lisboa, uma taxa de entrada no
Município, denominada de Taxa Municipal Turística, no montante de um euro.
3 Acompanhado da esposa e dos amigos
missionários, dirigiram-se para o Santuário de Fátima, numa viatura previamente
fretada, a fim de participar no início das cerimónias religiosas.
4 O Autor aproveitou para, durante a sua
estadia em Portugal, conhecer o centro e o norte do país.
5 A 29 de abril, regressa, acompanhado
de sua esposa, a Lisboa, tendo nesta permanecido por cinco dias (4 noites)
alojado no Hotel Machu Picchu.
6 A 3 de maio, data de regresso a Piura,
pelo gerente do Hotel e aquando do pagamento, reparou que na fatura emitida
constava uma verba de cinco euros relativa a taxa de alojamento por dormida.
Em
termos de matéria de Direito são considerados como necessários de apreciação as
seguintes questões:
1 Analisado o Regulamento n.º 2387/15 da
Câmara Municipal de Lisboa ficou provado que foram cumpridas todas as
formalidades essenciais para a sua elaboração de acordo com o previsto no CPA,
nomeadamente consulta pública e audiência dos interessados (Artigos 100º e
101º).
2 O ato administrativo de cobrança
encontra-se assim subjacente à emanação daquele regulamento, pelo que tendo em
conta que resulta de um ato simples e que se produziria de qualquer forma, a
audiência prévia, considerada à luz do CPA uma formalidade essencial, é
degradada numa formalidade não essencial. Ademais, conforme aludido no n.º 1, o
regulamento que determinou o ato administrativo já foi alvo de audiência dos
interessados.
3 Acresce-se que, analisada a prova n.º
1, confirmou-se que as faturas de cobrança das taxas têm alusão ao regulamento
que as fundamenta, pelo que se encontra preenchida a formalidade essencial de
fundamentação.
4 Assim sendo, tal como o regulamento,
também o ato administrativo cumpriu as formalidades essenciais.
5 O cerne da questão passa por averiguar
se estamos perante uma competência da Câmara Municipal de Lisboa na criação do
regulamento, estando em causa a divergência entre um imposto ou uma taxa.
6 Alega o autor que as taxas são
impostos camuflados, uma vez que não estamos perante a presença de uma
contraprestação, logo o requisito de sinalagma não está preenchido.
7 Na verdade, a serem qualificáveis de
impostos, a sua criação seria constitucionalmente de reserva relativa da
competência legislativa da Assembleia da República (Artigo 165º, Nº 1, alínea
i) da CRP). Dessa forma haveria manifesta inconstitucionalidade quanto à
criação do regulamento pela Câmara Municipal.
8 Pelo contrário, sendo consideradas
taxas, a Câmara Municipal tem competência na proposta de criação da taxa,
dependendo da respetiva aprovação por parte da Assembleia Municipal de Lisboa,
conforme se verificou (Artigo 25º, Nº 1, alínea b) da Lei n.º 75/2013), tendo o
regulamento norma habilitante.
9 Assim, avaliaremos de seguida a
diferença entre imposto e taxa. A doutrina é unânime ao distinguir um tributo
do outro, baseando-se no critério da unilateralidade e na bilateralidade,
respetivamente, que se baseia na existência ou não de uma contrapartida
específica.
10 Alberto Xavier esclarece que as taxas
são “a prestação da atividade pública, a utilização do domínio público e a
remoção do limite jurídico e por isso estas realidades e a taxa que lhes
corresponde encontram-se entre si ligadas por um nexo sinalagmático em termos
de uma se apresentar como contrapartida da outra”. Por sua vez, José Manuel da
Costa refere que “o imposto é uma prestação coativamente exigida pelo Estado
com carácter definitivo, em ordem à prossecução de uma finalidade (maxime financeira) não sancionatória, e
à qual não corresponde qualquer contrapartida específica”.
11 Sinalagma implica que ocorra uma
correlação entre a prestação administrativa e a taxa, decorrendo do sinalagma a
especificidade, a individualização, a proporcionalidade e a exigibilidade.
12 Ao ser individualizada, deverá oferecer
ao pagador uma utilidade proporcionada pela entidade a quem é paga, sendo que o
pagador tem direito a exigi-la. Ademais, a taxa deverá destinar-se a financiar
um serviço público prestado ou a pagar o benefício decorrente da utilização de
um bem público. Como tal, a sua receita não pode ser utilizada em outros fins.
13 Surge-nos a questão se a contrapartida
deverá equivaler rigorosamente ao montante da taxa. Ora, o princípio da
proporcionalidade a que a administração está adstrita, previsto no Nº2 do
Artigo 266º CRP, revela a necessidade de correlação mínima entre meios e fins
mas tal não deverá implicar uma equivalência rigorosa, sendo que a maioria da
doutrina entende que tal constitui uma diferença da ideia de preço de um
serviço definido pela tarifa. Como tal será apenas suficiente que não ocorra
uma desproporção entre o valor e o benefício.
14 Importa então definir aqui a fronteira
entre o imposto e a taxa. O imposto visa financiar despesas públicas em geral,
não podendo ser consignados a despesas específicas ou a certos serviços
públicos.
15 Já as taxas envolvem três
contraprestações: a fruição de um serviço público; a utilização de um bem
público ou a remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos
particulares. É na fruição destes bens que as receitas das taxas deverão ser
aplicadas.
16 Posto isto, e tendo em conta o fim do
regulamento criado pela Câmara Municipal de Lisboa – melhorar as condições de
acesso à cidade e das infraestruturas turísticas que esta oferece –, é de
considerar que se encontram preenchidos os requisitos previstos para as taxas, excluindo-se
a figura do imposto.
17 Tal como esclarece Marcelo Rebelo de
Sousa “trata-se da realização de prestação administrativa, latu sensu, envolvendo prestações stricto sensu de serviço público, fruição de bens de domínio
público ou remoção de obstáculo, no atinente quer àquele serviço, quer a esta
fruição”.
18 Ainda que a utilização do aeroporto seja
exclusivamente para aceder a outras cidades do país, a realidade é que são
utilizadas infraestruturas do município, estando estes totalmente ao dispor do
utilizador.
19 Assim sendo, ao encontrarmo-nos perante
taxas, é constitucional a criação do regulamento pelo município de Lisboa.
20 Comprovada a legalidade do regulamento e
do ato, importa agora esclarecer se estamos perante a violação do princípio da
igualdade ou se de uma discriminação positiva.
21 A Administração Pública está vinculada
ao princípio da igualdade e à não discriminação dos cidadãos (Artigo 266º, Nº 2
da CRP). O princípio da igualdade assenta em dois pilares: a obrigação de dar
tratamento igual a situações que sejam juridicamente iguais, e a obrigação de
dar tratamento diferenciado a situações que sejam juridicamente diferentes.
Estamos perante duas vertentes do princípio da igualdade: a proibição da
discriminação e a obrigação da diferenciação.
22 A invocação da discriminação positiva
deverá ser afastada, uma vez que não estamos perante medidas compensatórias
para um grupo de cidadãos que se encontram numa posição minoritária em relação
aos restantes. Não poderá ser comparado dois grupos distintos que usufruem de
infraestruturas de forma diferente, no caso a diferenciação entre nacionais e
estrangeiros.
23 Acresce o Artigo 6º do CPA que “nas suas
relações com os particulares, a Administração Pública deve reger-se pelo
princípio da igualdade, não podendo privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar
de qualquer direito ou isentar de qualquer dever ninguém em razão de
ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções
políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou
orientação sexual”.
24 A lei fundamental, Artigo 15.º, prevê
que os estrangeiros e os apátridas que se encontram ou residam em Portugal
gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português.
25 Ademais, aplica-se à ordem interna a
doutrina da União Europeia (Artigo 8º, Nº 4 da CRP), que implica como
liberalidade fundamental a livre circulação de pessoas e um tratamento uniforme
entre os cidadãos dos Estados-Membros (TFUE).
26 Ora, o regulamento do município de
Lisboa aplica a referida taxa apenas a estrangeiros e, dentro desses, os que
utilizam o aeroporto de Lisboa como porta de entrada no município.
27 No que diz respeito à utilização do
aeroporto, a Câmara Municipal de Lisboa procedeu já à alteração do regulamento
após acordo com a empresa Voa Voa – Aeroportos de Lisboa, pelo que fica sanada
a violação do princípio da igualdade perante outros cidadãos que utilizem
outros meios de acesso ao município.
28 No entanto, mantém-se a distinção no
regulamento da cobrança exclusiva a estrangeiros na utilização de
infraestruturas hoteleiras do município.
29 Como tal, não está respeitado o
princípio de igualdade a que a doutrina interna está sujeita, sendo que nos
encontramos perante a violação de princípios fundamentais constantes os Artigos
13º e 15º da CRP.
30 De acordo com o Nº1 do Artigo 143º do
CPA, são inválidos os regulamentos que sejam desconformes com a Constituição, a
lei e os princípios gerais de direito administrativo ou que infrinjam normas de
direito internacional ou de direito da União Europeia, sendo o seu desvalor a
nulidade.
Da
análise das matérias de facto e das matérias de Direito conclui-se:
1 É considerado nulo o Regulamento Nº
2387/15 da Câmara Municipal de Lisboa, não produzindo quaisquer efeitos
jurídicos, conforme Nº1 do Artigo 162º do CPA, por ser violador do princípio da
igualdade.
2 A nada é devido ao autor.
Custas
judiciais de acordo com o réu.
Registe
e notifique as Partes.
O
Coletivo de Juízes:
João
Couto, n.º 24000
Luís
Godinho, n.º 24834
Luís
João, n.º 24679
Nelson
Chicomba, n.º 21392
Paulino
Morais, n.º 24694
Pedro
Vieira, n.º 24730
Rafael
Lima, n.º 23144
Sónia
Fernandes, n.º 2399
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