Revelados no artigo 266º e ss. da
CRP são, primeiramente, princípios da constitucionalidade, ou seja, a sua
validade depende da conformidade com a constituição. No âmbito da atividade
administrativa são princípios jurídicos fundamentais que têm aplicabilidade
direta, vinculando a administração independentemente de uma lei que os
concretize. Para além deste facto, mostram ser princípios de controlo da
atuação administrativa, ou seja, são (em menor ou maior grau) limitativos da
margem de livre decisão da administração pública. São parâmetros de controlo da
discricionariedade administrativa e a prova de que esta é controlada.
São eles: o princípio da prossecução do interesse público; o princípio do respeito pelos direitos (ou posições jurídicas
subjetivas) dos particulares; o
princípio da justiça; o princípio da
imparcialidade; o princípio da
igualdade; o princípio da
proporcionalidade; e o princípio da
boa-fé.
Quanto ao primeiro princípio, o
da prossecução do interesse público
está presente no artigo 266º/1 CRP bem como no artigo 4º CPA. É o princípio
concretizador da administração e do direito administrativo na medida em que
reflete um interesse público concreto e tem em vista um fim legal. Este princípio
relacionando-se com o princípio da proteção dos direitos e interesses dos
cidadãos e com o princípio da legalidade. A administração por estar subordinada
ao princípio da legalidade (artigo 3ºCPA) está consequentemente vinculada a
seguir o interesse público como é determinado na constituição: só pode
prosseguir interesses públicos, não pode prosseguir interesses privados; e só
pode prosseguir interesses públicos fixados pela constituição para cada
situação administrativa concreta que esteja normativamente autorizada.
Esta circunstância de não poder
desviar-se do fixado pela constituição justifica o facto de este princípio ser
um limite à margem de decisão da administração pública. E se a administração
não respeitar a prossecução do interesse público como definido pela
constituição? Quais são os desvalores jurídicos associados? Se prosseguir
interesses privados ou interesses distintos dos estabelecidos normativamente,
acarreta um desvio de poder, sendo esse poder ilegal, gerando a sua invalidade.
Ao nível das competências das pessoas coletivas administrativas, se o interesse
público praticado por um órgão for da competência de outro, estaremos perante
um vício de incompetência.
De ressalvar a ideia de que este
princípio é um limite à margem de livre decisão da administração pública apenas
quanto ao tipo de interesse público a
prosseguir, ou seja, se prosseguir um interesse público ou privado diferente do
fixado por lei. Já não é um limite em relação ao modo como a administração,
dentro desse interesse fixado, decide aplicar/seguir
o interesse público. O interesse público é um conceito indeterminado por não
fixar qual o melhor modo de o prosseguir, pelo que a administração tem uma larga
margem de decisão em relação a esse modo de aplicação/prossecução. A
administração não pode ver o seu ato anulado pelo tribunal achar que o modo X ou Y não foi o melhor modo de prosseguir o interesse público pois o próprio conceito
não determinada qual o melhor modo de o fazer. Contudo, a administração, dentro
desta margem de livre decisão está e tem que estar constrangida ao dever de boa
administração (artigo 5ºCPA).
Quanto a princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos
dos cidadãos, está exposto no artigo 266º/1 CRP e no artigo 4ºCPA. Exprime
a relação de paridade que deve existir entre a administração pública e os
particulares, não devendo existir situações de inferioridade em relação às
posições jurídicas subjetivas dos cidadãos. É neste sentido que este princípio
é também um limite da atuação da administração pública. Proíbe-se o desrespeito
e a violação de direitos e interesses legalmente protegidos, ou seja, não são
admitidas restrições que não sejam legalmente permitidas e estas não podem
opor-se ao bloco de legalidade. Este princípio está dependente do princípio da
legalidade e é ele o fundamento da sua limitação.
Em relação ao princípio da justiça, referido no artigo 266º/2 e no artigo 8ºCPA,
é um princípio que merece respeito e aplicabilidade aquando a atuação da
administração pública. Requer decisões justas, com rigor, certas e adequadas,
de acordo com o que é a lei, o direito, a jurisdição. Neste sentido, a justiça
diz respeito à esfera da legalidade e não do mérito da atuação administrativa. Deste
princípio resultaram outros como o princípio da imparcialidade, da igualdade,
da boa-fé, da tutela da confiança ou o princípio da legalidade pelo que a
concretização da justiça é também a concretização destes princípios e a
violação destes pode implicar uma situação injusta. Todavia, este princípio é o
menos limitativo da atuação administrativa, e porquê? Primeiro porque é um
conceito de difícil aplicação; e segundo, porque é um conceito de avaliação
subjetiva e por este motivo a sua anulação só se pode verificar quando se
alcance um entendimento intersubjetivo de injustiça: casos manifestos e
ostensivos de violação do princípio da justiça.
O princípio da imparcialidade,
presente no artigo 266º/2 CRP e no artigo 9ºCPA pode ser entendido como o não
favorecimento ou desfavorecimento em relação aos titulares ou agentes
administrativos com fundamento em ligações ou relações pessoais com os mesmos
que venham a influenciar as suas decisões. Também pode ser entendido como a
capacidade da administração, na tomada de decisões, refletir nos interesses
públicos ou privados essenciais e importantes para cada atuação concreta. Este
princípio tem duas dimensões: uma positiva (que requer que a administração
antes da tomada de uma decisão tenha o cuidado de apreciar os interesses
públicos ou privados relevantes para a decisão em causa) e uma negativa (que vem negar à administração
a ponderações de interesses públicos ou privados que sejam irrelevantes para a
decisão). Ainda sobre o princípio da imparcialidade referir que no artigo 69º a
73º do CPA são asseguradas as garantias de
imparcialidade, ou seja, formas de certificar que os titulares dos órgãos
da administração pública não se desviam da imparcialidade e que não serão
influenciados nas suas decisões. Nos casos em que tal acontece, desenrolam-se impedimentos. Nas situações concretas do
artigo 69ºCPA existe um impedimento
absoluto do titular do órgão. Este impedimento proíbe o titular do órgão de
praticar algum ato no procedimento em questão (69º/1 CPA); tem aplicabilidade
automática a partir do momento em que tais situações se verificam (69º/1, 70º/1
e 71º/1 CPA); e como agentes impedidos, os seus atos ou contratos efetuados são
ilegais e anuláveis (76º/1 CPA). Já do artigo 73ºCPA resulta antes um impedimento relativo, ou seja, tem que
se concretizar o previsto na disposição do artigo 73º/1 CPA. O titular do órgão,
contrariamente ao que acontece nas situações de impedimento absoluto, tem a
legitimidade de continuar a participar no procedimento em causa (75º/3, 71º e
72º CPA).
Quanto ao princípio da igualdade está consagrado no artigo 266º/2CRP, no
artigo 13ºCRP e no artigo 6ºCPA. O objetivo deste princípio é o de evitar que a
ação da administração não produza desigualdades e que, caso estas existam, o
dever de esta sanar as mesmas. Deve definir se determinadas situações são de
paridade ou não e trata-las de forma adequada às suas exigências. Neste
sentido, a administração pode atuar de duas formas distintas: ou tem o dever de proibir a discriminação ou tem
a obrigação de diferenciar situações.
Ou seja, no primeiro caso (num sentido negativo) a administração tem que ter
cautela e não inserir desigualdades no que deve ser igual nem inserir
igualdades no que é desigual; ou então (num sentido positivo) tratar de forma
igual o que é igual ou evitar que alguém trate de forma desigual o que deve ser
igual. No segundo caso em que existe antes uma obrigação de diferenciação
requer que a administração aplique as desigualdades necessárias para que se
obtenha situações de igualdade. Deste modo, o princípio da igualdade não tem
muita força limitativa em relação à margem de livre decisão da administração
pois para que uma situação viole o princípio da igualdade e para que exista uma
invalidade é necessário verificar-se uma paridade ou diferença entre duas
situações concretas e entre o modo como foram regradas (a sua prova em tribunal
é bastante difícil).
O princípio da proporcionalidade presente no artigo 266º/2CRP e no
artigo 7ºCPA é um princípio que tem como pressupostos três elementos: a adequação (que corresponde a uma adoção
de condutas apropriadas para a realização das finalidades subjacentes); a necessidade/proibição do excesso (que
resulta na escolha de condutas administrativas imprescindíveis ao fim a
prosseguir e que sejam as menos restritivas possíveis para os interesses
públicos ou privados em questão); e a razoabilidade
(=proporcionalidade em sentido restrito). Estes pressupostos são
cumulativos, ou seja, a não verificação de um resulta numa rejeição da validade
do princípio da proporcionalidade. Quanto ao facto deste princípio mostrar ser
um limite à livre decisão administrativa, é uma realidade que se verifica
concretamente no pressuposto da razoabilidade na medida em que o controlo
judicial tem-se limitado aos casos de desrazoabilidade
(casos em que a administração cria uma qualificação errônea de uma
realidade a partir de um conceito indeterminado) e quando estes casos
acontecem, como consequência, a necessidade e adequação também não se encontram
preenchidas.
Por fim, em relação ao princípio da boa-fé encontra-se
consagrado no artigo 266º/2 CPR e no artigo 10º CPA e vincula não só a
administração como também os particulares que com ela venham a relacionar-se.
É, portanto, um princípio que tem aplicação não só no direito público como
também no direito privado. Inicialmente era um princípio de Direito Civil, hoje é um princípio geral de Direito. A boa-fé vincula: a administração em relação aos
particulares; os particulares em relação à administração; e as entidades
públicas entre si. Atuar de boa-fé é, no fundo, atuar de acordo com valores de
natureza ética. Este princípio tem uma dupla dimensão: o princípio da primazia da materialidade subjacente (artigo 10ºCPA
quando se lê “(…)objetivo a alcançar com a atuação empreendida.”) e o princípio da tutela da confiança (artigo
10ºCPA quando se lê “a confiança suscitada na contraparte pela atuação em
causa.”). A tutela da confiança: prevê
5 pressupostos (os mesmos utilizados no Direito Civil): uma atuação que vem
criar uma situação de confiança; fatores que justifiquem a validação dessa
confiança; o decorrer de ações ou omissões que desenvolveram a confiança, ou
seja, o investimento da confiança; um nexo de causalidade entre a atuação que
criou a confiança e a concreta situação de confiança; e por último, a
frustração da confiança. Como limite da atuação administrativa, a sua violação
origina responsabilidade civil, podendo impor à administração uma conduta
esperada e cingir a prática de condutas administrativas que se tornem
contrárias a este princípio. A primazia da materialidade subjacente: não mostra
ter especial relevância como limite à atuação administrativa na medida em que o
princípio da legalidade não abrange o seu conteúdo e porque parte do seu
conteúdo, em termos práticos, assemelha-se ao princípio da proporcionalidade. Todavia,
o princípio da primazia da materialidade subjacente tem a sua relevância no
direito privado, nomeadamente, em relação às condutas dos particulares na
relação com a administração.
Nota: Os artigos mencionados
relativamente ao CPA, dizem respeito ao código de procedimento administrativo
de 2015.
Bibliografia: Marcelo Rebelo de
Sousa/André Salgado de Matos, «Direito Administrativo Geral», D. Quixote,
Lisboa – tomo I, «Introdução e Princípios Fundamentais», 3ªedição, 2008.
Carolina Amaro, aluna nº22595
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