segunda-feira, 25 de maio de 2015


 DIREITO ADMNISTRATIVO II

            A separação de Poderes e o Poder administrativo

            A separação de poderes é um princípio característico da forma de governo democrático-representativo e pluralista ocidental. Pode-se dizer que direitos fundamentais e o princípio da separação de poderes constituem o conteúdo essencial da Constituição moderna.
            O princípio da separação de poderes encontra uma tradução no plano do Direito Constitucional e no plano do Direito administrativo.
            No Plano do Direito Constitucional – O princípio da separação de poderes visou tirar ao Rei e aos seus Ministros a função de legislar, dando-lhes apenas a função politica e administrativa, ou seja, visou a separação entre o legislativo e o executivo. Neste plano, o grande objectivo da separação de poderes era evitar o despotismo protegendo os direitos fundamentais dos cidadãos.
            No plano do Direito administrativo – O princípio da separação de poderes visou a separação entre a administração e a justiça, isto é, retirar à administração pública a função judicial e retirar aos tribunais a função administrativa.

Princípio da separação de poderes no campo do direito administrativo
            Como já foi referido atrás, o princípio da separação de poderes no campo do direito administrativo, visou a separação entre a administração pública e a justiça, para que tal seja conseguido, é necessário:
            A separação dos órgãos administrativos e judiciais – Quer isto dizer, que tem de existir órgãos administrativos dedicados ao exercício da função administrativa e órgãos judiciais dedicados ao exercício da função jurisdicional.
            A incompatibilidade dos magistrados – Nenhuma pessoa pode simultaneamente exercer funções administrativas e judiciais (art.º 216 nº 2 da CRP).
            A independência reciproca da administração e da justiça, que se desdobra em dois aspectos:
            A independência da justiça perante a administração- Significa que a autoridade administrativa não pode dar ordens à autoridade judiciária, nem pode invadir a sua esfera de jurisdição. Todos os actos praticados pela administração pública em matéria da competência dos tribunais judiciais são nulos e de nenhum efeito, por estarem viciados de usurpação de poder, no actual CPA artº 161 nº 2 e (art.º 133 nº 2 do CPA de 1991),
            A independência da administração perante a justiça- Significa não uma proibição absoluta de o juiz condenar, intimar, orientar ou impor comportamentos à administração (art.º 268 nº 4 da CRP), mas sim de uma proibição funcional, quer isto dizer, que o juiz não pode interferir na autonomia do poder administrativo, núcleo essencial da discricionariedade. Esta independência significa também que não são os tribunais comuns, ou seja, os tribunais judiciais, para resolver os litígios em que esteja em causa uma actividade da administração pública, são pois os tribunais administrativos (art.º 212 nº 3 da CRP). Contudo esta regra conhece algumas excepções, como o caso de impugnação judicial .
           
Manifestações do poder administrativo
           
As principais manifestações do poder administrativo são quatro:
1º O Poder regulamentar
2º O poder de decisão unilateral
3º O privilégio da execução prévia
4º O regime especial dos contratos administrativos

1º Poder regulamentar
            Este poder consta no art.º 199 da CRP, e é o poder da administração pública de fazer regulamentos. O regulamento é colocado abaixo da lei, no ponto de vista da hierarquia das fontes.

2º Poder de decisão unilateral
            Enquanto no regulamento a administração pública aparece a fazer normas gerais e abstractas, aqui a administração pública aparece-nos a decidir casos individuais e concretos.     Os particulares devem obediência aos actos administrativos pelos quais nos casos concretos a administração pública define direito. Pode a lei exigir nos termos do art.º 100 e sgs do CPA, que os interessados sejam ouvidos pela administração, antes de esta tomar a sua decisão.
            Pode ainda a lei facultar artº 184 e ss do actual CPA, (art.º 158 e sgs do CPA de 1991) aos particulares a possibilidade de apresentarem recursos hierárquicos ou reclamações contra as decisões da administração pública. Por fim a lei permite ainda que os interessados impugnem as decisões unilaterais perante os tribunais administrativos.

3º O privilégio da execução prévia
            A administração pública tem a faculdade de impor coerciva mente aos particulares as decisões unilaterais constitutivas de deveres ou encargos que tiver tomado e que não sejam por aqueles voluntariamente cumpridas artigo 175º do novo CPA (art.º 149º nº 1 do CPA de 1991). No entanto o particular tem depois disso, o poder de recorrer aos tribunais administrativos para impugnar a decisão feita, pedindo a anulação do acto administrativo.

4º Regime especial dos contratos administrativos
            Corolários do poder administrativo
            Independência da administração pública perante a justiça.
            Foro administrativo – A competência para julgar os litígios administrativos não são os tribunais judiciais mas sim os tribunais administrativos.
            Existência de um tribunal de conflitos (existe em Portugal e em França) -Tribunal que se destina a resolver em última instância conflitos que possam surgir entre o tribunal judicial e o tribunal administrativo. No Tribunal de Conflitos tem de estar representados, representantes do tribunal judicial e administrativo.

Princípios constitucionais sobre o poder administrativo-Artur 266 da CRP
            1º Princípio de prossecução do interesse público
            O fim da administração pública é a prossecução do interesse público, contudo, não o pode fazer de qualquer maneira, tem de o fazer dentro de certos limites, com respeito por outros dois princípios:
            O princípio pelo respeito dos direitos dos cidadãos.
            O interesse público traduz-se na satisfação das necessidades colectivas.
            É a lei que define os interesses públicos a prosseguir pela administração, não pode ser esta a defini-los, salvo se a lei a habilitar para tal.
            A noção de interesse público é uma noção variável, quer isto dizer, que o que ontem era considerado conforme ao interesse público pode hoje ser-lhe contrário, e o que hoje pode ser inconveniente pode amanhã ser vantajoso.
            A satisfação do interesse público é uma das consequências do dever de uma boa administração (art.º 81 da CRP).
           
2º Princípio da legalidade
            A administração pública tem de prosseguir o interesse público em obediência à lei- é o que se chama o princípio da legalidade. Este é um dos mais importantes princípios aplicáveis à administração pública, encontra-se consagrado no art.º 266 nº 2 da CRP:

Breve resenha histórica
            É com a Revolução Francesa, que se estabelece o princípio da subordinação à lei: a administração pública fica submetida à lei, é o início do princípio da legalidade. Seguidamente a Revolução Francesa, dá-se uma evolução, em que a monarquia liberal do séc. XIX dá origem na Europa a três regimes diferentes - regime autoritário da direita nomeadamente as ditaduras tipo fascista e os regimes comunistas; por outro lado as democracias modernas.
            Nos regimes autoritários da direita, não se assiste a uma necessária subordinação do poder executivo ao parlamento, mas principalmente a subordinação da administração pública ao governo. Chega-se assim à noção de legalidade socialista, que era um instrumento do poder administrativo ao serviço e dos fins de natureza politica consagrados na Constituição do respectivo país e definidos pelo partido único.
            Finalmente nos regimes democráticos de tipo ocidental, o princípio da legalidade sofre algumas modificações relativamente ao que tinha no Estado Liberal, assim, nesta fase a administração pública só pode agir no que a norma jurídica lhe permitir, quer no interesse da administração quer no interesse dos particulares.
            Na actualidade e no direito português, são duas as funções do princípio da legalidade: a função de assegurar o primado do poder legislativo sobre o poder administrativo e garantir os direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares.

Objecto e modalidades do princípio de legalidade
            Objecto – O princípio da legalidade tem como objecto todos os tipos de comportamento da administração publica-o regulamento; o acto administrativo; o contrato administrativo; os simples factos jurídicos. A violação da legalidade por qualquer destes tipos de actos gera ilegalidade.
            Modalidades - O princípio da legalidade comporta duas modalidades:
            1ª Preferência de lei- Consiste em que nenhum acto de categoria inferior à lei pode contrariar o bloco de legalidade, sob pena de ilegalidade.
            2ª Reserva de Lei – Consiste em que nenhum acto de categoria inferior pode ser praticado sem fundamento no bloco de legalidade.

Excepções ao princípio da legalidade
            A maioria da doutrina considera três excepções ao princípio da legalidade: Estado de necessidade; a teoria dos actos políticos; o poder discricionário da administração. No entanto para o Professor Freitas do Amaral, nenhuma destas situações são consideração excepções ao princípio da legalidade porque:
            1º Estado de necessidade- Porque é aceite pela maioria da doutrina e jurisprudência de todos os países democráticos e está consagrada no art.º 3 nº 2 do CPA actual e de 1991.
            2º Teoria do actos políticos – Não são susceptíveis de recurso contencioso perante os tribunais administrativos. Mas se estes actos forem considerados ilegais pode haver outras sanções, como por exemplo responsabilidade civil.
            3º Poder discricionário da administração – É antes um modo especial de configuração da legalidade administrativa. Só há poderes discricionários até onde a lei os confere como tais.

Âmbito do princípio da legalidade
            O princípio da legalidade abrange todas as manifestações da administração pública: as da administração constitutiva ou de prestação e da administração agressiva- art.º 266 nº 2 da CRP.
            Conclui-se que no âmbito o princípio da legalidade, quem tem de definir o interesse público a prosseguir pela administração é a lei e não a própria administração; mesmo no quadro da administração constitutiva ou de prestação, mesmo quando se trata de conceder um direito ou de prestar um serviço, ou de fornecer bens a particulares.

3º Princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares
            O interesse pública a prosseguir pela administração pública deve respeitar os interesses legalmente protegidos dos particulares. No entanto não basta o escrupuloso cumprimento da lei por parte da administração pública, para que se verifique o respeito integral dos direitos dos particulares legalmente protegidos, outras formas de protecção existem como por exemplo:
            Estabelecimento da possibilidade de suspensão jurisdicional da eficácia do acto administrativo, quando da sua execução possam resultar prejuízos para o particular.
            Estabelecimento da responsabilidade da administração aos danos causados por facto causais, bem como actos lícitos que imponham cargos ou prejuízos especiais e anormais as particulares.
            Imposição expressa do limite do respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos às actividades de natureza policial.

Poder discricionário da administração pública
       Como já foi referido a administração pública está subordinada à lei nos termos do princípio da legalidade. Umas vezes a lei pormenoriza em que sentido deve administração pública actuar, ou seja vincula totalmente a administração, pelo qual esta não tem a possibilidade de efectuar qualquer escolha- é o chamado acto vinculado. Noutras situações a lei praticamente nada diz, nada regula, e atribui uma significativa margem de autonomia à administração pública, é ela que tem de decidir segundo os critério adequados à prossecução do interesse público- estamos perante actos discricionários.
        No entanto é preciso ter em atenção que não há discricionariedade absoluta. Pode-se dizer até, que não há actos totalmente discricionários nem totalmente vinculados, pois todos os actos administrativos são em parte discricionários e em parte vinculado.

Natureza do acto discricionário
        Para haver discricionariedade é necessário que a lei atribuía à administração o poder de escolhe entre várias alternativas diferentes de decisão, quer o espaço de escolha esteja apenas entre duas decisões contraditoriamente opostas, quer entre várias decisões à escolha numa relação disjuntiva.
     Concluindo na discricionariedade, a lei não dá ao órgão administrativo competente liberdade para escolher qualquer solução que respeite o fim da norma, antes o obriga a procurar a melhor solução para a satisfação do interesse público de acordo com os princípios jurídicos de actuação. A discricionariedade não é uma liberdade mas um poder – dever jurídico.

Fundamento e poder discricionário
            O poder discricionário da administração pública fundamenta-se no princípio de separação de poderes, na própria concepção de Estado social de Direito, enquanto Estado prestador e constitutivo de deveres positivos para a administração.
            É claro que fundamentando-se o poder discricionário na separação de poderes e na concepção de Estado Social de Direito, não fica de fora o princípio da legalidade.
            Pois hoje ao contrário no Estado Policia, em que o poder discricionário era um poder inato, derivava da legitimidade monárquica do Rei absoluto, não é um poder inato, é um poder derivado da lei:
            Só existe quando a lei o confere e na medida em que a lei o configura.
            O poder discricionário só pode ser exercido por aqueles a quem a lei o atribuir, só pode ser exercido para o fim com que a lei confere, e deve ser executado de acordo com certos princípios jurídicos.
            O poder discricionário é controlável jurisdicionalmente.

Evolução histórica do poder discricionário
            A evolução histórica do poder discricionário ficou caracterizada pelo progresso da ideia da subordinação deste poder da administração pública a limites legais, controlo jurisdicional do respeito por esses limites.
            No Estado de Policia, o poder administrativo era totalmente discricionário, não tinha fundamento na lei nem a lei estabelecia quaisquer limites ao se exercício.
            Numa segunda fase do Estado de policia, subiste o poder do Monarca e de todos aqueles que com ele colaboram como poder inato.
            Nesta segunda fase, distinguem-se duas formas de administração: a administração pura e a administração contenciosa.
           
Âmbito do poder discricionário da administração pública
São os seguintes aspectos que podem ser discricionários:
            Momento da prática do acto – A administração terá a faculdade de praticar o acto agora ou mais tarde conforme melhor entender.
·        Decisão de praticar ou não certo ato administrativo.
·        Determinação dos factos e interesses relevantes para a decisão.
·        Determinação do conteúdo concreto da decisão a tomar-discricionariedade de escolha.
·        Forma a adoptar para o acto administrativo.
·        Formalidade a observar na preparação do ato administrativo.
·        Fundamentação ou não da decisão artigo 152º do novo CPA e (art.º 124 do CPA de 1991).
·        Faculdade de colocar ou não o acto administrativo a condições, modos ou outras cláusulas artº 149 do actual CPA e (art.º 121 do CPA de 1991).

Limites do poder discricionário
            O poder discricionário da administração pública pode ser limitado juridicamente por duas formas:
            No âmbito que a discricionariedade que a lei conferes à administração, esta pode exercer os seus poderes de duas maneiras:
·        Pode exerce-los caso a caso, adoptando em cada caso a solução que lhe parecer mais adequada.
·        Mas a administração também pode exerce-la de outra forma: com base de uma previsão do que poderá vir acontecer, ou na base de uma experiência sedimentada.
            É preciso ter em atenção que a auto vinculação da administração pública não é ilimitada, a administração não pode auto-vincular-se com desrespeito do art.º 112 nº 5 da CRP.

Controlo do exercício do poder discricionário
O poder discricionário da administração pública está sujeita a 4 tipos de controlo:
1.      Controlo de legalidade – Visa determinar se administração respeitou ou não a lei.
2.      Controlo de mérito – Visa avaliar o bem fundado das decisões da administração. O mérito de um ato administrativo deve ter em conta o ideia de justiça e a ideia de conveniência: a ideia de justiça diz respeito a harmonia que deve existir num ato administrativo entre o interesse público que deve prosseguir e os interesses particulares legalmente protegidos; a conveniência diz respeito a adequação que deve existir num ato administrativo.
3.      Controlo jurisdicional – Controlo que se efectua através dos tribunais
4.      Controlo administrativos – Controlo realizada por órgãos da administração.
            O controlo de legalidade tanto pode ser feito pelos tribunais administrativos como pela própria administração, competindo em última análise aos tribunais. O controlo de mérito só pode ser feito pela administração.
            O uso de poder vinculados que tenham sido exercidos contra a lei são objecto do controlo de legalidade enquanto o uso de poderes discricionários são objecto de controlo de mérito.
Impugnação de actos discricionários administrativos
Hoje os actos discricionários podem ser impugnados com fundamento em qualquer dos seguintes vícios:
·        Com fundamento em incompetência do órgão que os exerceu.
·        Vício de forma, nomeadamente por preterição de formalidades essenciais de deviam ter sido observadas.
·        Violação da lei, como ofensa de quaisquer limites impostos ao poder discricionário e ao poder de auto-vinculação.
·        Defeitos da vontade, nomeadamente erro de facto que é mais frequente.

Interpretação de conceitos indeterminados
            Conceitos indeterminados são conceitos que não permitem uma comunicação clara quanto ao seu conteúdo.         
             O importante nos conceitos indeterminados é saber se é uma actividade vinculada ou discricionária e por conseguinte, sindicável, ou não pelos tribunais.
            Através de uma percepção da heterogeneidade dos conceitos indeterminados leva-nos hoje afirmar que alguns deles são um instrumento que a lei se serve para atribuir discricionariedade à administração.
            Assim temos de um lado o caso de conceitos indeterminados cuja concretização apenas envolve operações de interpretação da lei e de subsunção; do outro temos aqueles conceitos cuja concretização apela para preenchimentos valorativos por parte do órgão administrativo aplicador do Direito.

            Concluindo a concretização administrativa de conceitos indeterminados traduz muitas vezes o exercício de interpretação da lei, noutras traduz o exercício de verdadeira discricionariedade, sendo que, quanto assim sucede o tribunal não pode reapreciar o acto da administração para lhe substituir outro, se o fizesse, estaria a exercer a função administrativa e não a função jurisdicional, pelo que haveria dupla administração, contrária ao princípio da separação de poderes.




           

       Maria Isabel Pereira Marques Monteiro                                                                                                         Aluna nº 19413           

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