Do regulamento: auto-exequibilidade da norma legal que
estabelece a audiência dos interessados
Noção procedimental quanto ao
regulamento administrativo(CPA de 7 Janeiro de 2015):
O
procedimento da actividade administrativa em geral, que vai do artigo 53º a 96º
CPA, aplica-se também aos regulamentos. Embora a lei nada diga a esse respeito,
as disposições constantes no artigo 97º e ss CPA, aplicam-se somente a
regulamentos com eficácia externa. O procedimento do regulamento tem quatro
fases: a iniciativa; fase de preparação do projecto de regulamento; fase da
participação dos interessados; fase de conclusão. o procedimento regulamentar é
de iniciativa privada através de a apresentação de petições (artigo 97 CPA). O
órgão com competência regulamentar deve informar os interessados de qual o
destino que deu à petição de deve apresentar os fundamentos da posição adoptada
(artigo 97º CPA). A fase de preparação do projecto é uma fase que não encontra
na lei total vinculação, esta não regula todos os seus trâmites. Durante esta
fase a administração pode ouvir órgãos e serviços públicos que serão
encarregues da sua aplicação, pode solicitar pareceres e pode também ouvir os
destinatários a quem o regulamento se reporta (artigo 98º CPA). Aqui nesta fase
essa audição é quanto à iniciativa, o que é diferente da pronuncia quanto ao
projecto de regulamento que foi elaborado, essa será em sede de audiência dos
interessados para efeito do artigo 100 CPA. O artigo 99º do CPA impõe um dever
de fundamentação que deve constar no projecto de regulamento. Na fase da
participação dos interessados essa mesma participação pode acontecer por
audiência (artigo 100º CPA) ou por consulta pública (101º CPA). A lei
estabelece que é obrigatória a audição
nos procedimentos que visem a adopção de regulamentos desfavoráveis para
os seus destinatários (artigo 100º nº1). Esta audição pode ser dispensada se se
verificar o preenchimento de qualquer uma das alíneas do nº3 do artigo 100.
Quanto à consulta pública, visa apurar a opinião não só dos interessados , mas
também de qualquer pessoa, acerca do projecto de regulamento. Esta não é
exigida quando a natureza da matéria o não permita (artigo 101 nº1 CPA). Quanto
à fase de conclusão, o modo normal é o da aprovação do regulamento, mas pode
suceder que o procedimento termine por outra causa que não a aprovação (por
exemplo, pode terminar com a arquivo das petições que deram inicio ao
procedimento).
A participação constitui um elemento
fundamental da compreensão do próprio Estado de Direito, a ideia do princípio
democrático, onde os cidadãos são chamados a participar nas decisões públicas
como forma de democratizar a administração. A constituição acolhe-o no artigo
276º nº1.
No antigo CPA a audiência dos
interessados seria uma norma legal não auto-exequível, a audiência dos
interessados no procedimento regulamentar seria portanto uma formalidade de
realização meramente discricionário, não gerando, a sua omissão qualquer
ilegalidade do regulamento que venha a ser aprovado. Esta é precisamente a
jurisprudência que o Supremo Tribunal administrativo proferiu no Acórdão
2/7/2002, processo 0519/02. O tribunal entendeu quanto à audiência dos
interessados e dever de fundamentação soluções opostas. Quanto à audiência dos
interessados (artigo 100º no “novo” CPA e 117º do CPA de 1991), o tribunal
entendeu não se tratar de uma norma automaticamente exequível porque da letra
resulta que, quando esta diz “nos termos a definir em legislação própria”, tem
de haver uma norma que regule especificamente trâmites a seguir quanto à
audiência (norma essa que nunca foi aprovada), essa norma deveria provir de um
regulamento, por isso, a preterição desta formalidade essencial, como não
existe tal norma regulamentar, não sofre nenhum vício de invalidade.
Diferentemente decidiu o tribunal quanto ao dever de fundamentação (artigo 99º
do novo CPA, artigo 116º do CPA de
1991), aqui o tribunal atribui à norma constante do então CPA uma obrigatoriedade, por ser uma
norma legal automaticamente exequível, de em todos os projectos de regulamento
quando submetidos a aprovação serem acompanhados de fundamentação que os
justifique.
Com a entrada em vigor do CPA de 7
Janeiro de 2015, a questão de se saber se a norma legal que consagra a
audiência dos interessados é auto-exequível já não se coloca. Hoje o artigo
100º nº1 disciplina automaticamente a audiência dos interessados, já não remete
para legislação especial, como fazia o “antigo” CPA, o regime específico da
participação dos interessados e dos representantes, e como tal, já não faz
qualquer sentido hoje em dia não se considerar obrigatória esta formalidade
essencial sobre o pretexto de a mesma não ser exequível automaticamente pela
norma do CPA. No nosso entender a sua preterição por razões diversas das que
constam no nº3 do artigo 100º CPA, gera uma invalidade.
Bibliografia:
SOUSA, Marcelo Rebelo; MATOS, André Salgado; Direito Administrativo Geral-actividade administrativa, Tomo III, Dom Quixote, Lisboa, 2006;
Bibliografia:
SOUSA, Marcelo Rebelo; MATOS, André Salgado; Direito Administrativo Geral-actividade administrativa, Tomo III, Dom Quixote, Lisboa, 2006;
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